Na manhã desta quarta-feira (29), o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, manifestou extrema preocupação com o alto número de mortes na operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, realizada na terça-feira (28) nas comunidades do Complexo da Penha e do Complexo do Alemão.
Em comunicado no portal da ONU e lido por seu porta-voz, Stephane Dujarric, Guterres destacou que o uso da força por autoridades policiais deve estar em conformidade com as leis internacionais de direitos humanos, e pediu uma investigação imediata e independente sobre o episódio.
De acordo com dados oficiais, 58 pessoas morreram durante a Operação Contenção, incluindo quatro policiais — embora números extraoficiais apontem até 121 mortos. Outras 81 pessoas foram presas. A ação, segundo o governo do estado, tinha como objetivo o cumprimento de cerca de 100 mandados judiciais contra integrantes de organizações criminosas.
O Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk, também se pronunciou, pedindo uma “reforma abrangente dos métodos de policiamento no Brasil”. Ele afirmou compreender os desafios de enfrentar facções como o Comando Vermelho, mas criticou o padrão de operações que resultam em grande número de mortes, “afetando desproporcionalmente pessoas negras”.
Turk alertou que a alta letalidade policial tem sido normalizada no Brasil e cobrou que o país “rompa o ciclo de brutalidade extrema”. O comissário defendeu investigações rápidas, independentes e eficazes, reforçando que o uso da força deve obedecer aos princípios de legalidade, necessidade, proporcionalidade e não discriminação.
Racismo sistêmico e violência policial
O Alto Comissário também ressaltou que “é urgente enfrentar o racismo sistêmico contra pessoas negras no Brasil”, citando dados do Mecanismo Internacional Independente de Especialistas para Promover a Justiça Racial e a Igualdade na Aplicação da Lei, que estima que cerca de 5 mil pessoas negras sejam mortas pela polícia todos os anos no país. Jovens negros, moradores de áreas empobrecidas, continuam sendo as principais vítimas.
Governo do Rio defende a operação
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, classificou a Operação Contenção como “um sucesso”. Em entrevista no Palácio Guanabara, ele afirmou que “as únicas vítimas foram os quatro policiais mortos” e que o conflito ocorreu “em área de mata, longe de zonas residenciais”.
Castro disse que o número oficial de mortos é de 58, incluindo os agentes das forças de segurança, mas admitiu que “esse dado ainda deve mudar”. Ele defendeu a ação como um “duro golpe na criminalidade”, mas reconheceu que a “guerra contra o crime não será vencida sozinha”.
Críticas e repercussão
Moradores dos complexos da Penha e do Alemão relataram horas de tiroteio, bloqueios e pânico durante a operação. Especialistas em segurança pública não revelados e movimentos de favelas classificaram a ação como “desastrosa e desproporcional”, apontando que ela não atingiu o objetivo de conter o crime organizado.
A professora Jacqueline Muniz, da Universidade Federal Fluminense (UFF), chamou a operação de “lambança político-operacional”, afirmando que o episódio demonstra a ausência de planejamento e de controle sobre o uso da força.
A ONU reforçou que continuará acompanhando o caso e cobrou do governo brasileiro respeito aos padrões internacionais de direitos humanos nas operações de segurança pública.















